terça-feira, 1 de outubro de 2013

Somos queijo gorgonzola – mas podemos ser peras com gorgonzola e mel.


E de repente, não mais que de repente, aparecem leituras que me são tão interessantes, deliciosamente interessantes, que me inspiram gastronomicamente. É o caso do texto abaixo, que me levou a repensar a forma de olhar para a comida.



 “Somos queijo gorgonzola”
Estamos envelhecendo, estamos envelhecendo, estamos envelhecendo, só ouço isto. No táxi, no trânsito, no banco, só me chamam de senhora. E as amigas falam “estamos envelhecendo”, como quem diz “estamos apodrecendo”. Não estou achando envelhecer esse horror todo. Até agora. Mas a pressão é grande. Então, outro dia, divertidamente, fiz uma analogia.
O queijo Gorgonzola é um queijo que a maioria das pessoas que eu conheço gosta. Gosta na salada, no pão, com vinho tinto, vinho branco, é um queijo delicioso, de sabor e aroma peculiares, uma invenção italiana, tem status de iguaria com seu sabor sofisticadíssimo, incomparável, vende aos quilos nos supermercados do Leblon, é caro e é podre. É um queijo contaminado por fungos, só fica bom depois que mofa. É um queijo podre de chique. Para ficar gostoso tem que estar no ponto certo da deterioração da matéria. O que me possibilita afirmar que não é pelo fato de estar envelhecendo ou apodrecendo ou mofando que devo ser desvalorizada.
Saibam: vou envelhecer até o ponto certo, como o Gorgonzola. Se Deus quiser, morrerei no ponto G da deterioração da matéria. Estou me tornando uma iguaria. Com vinho tinto sou deliciosa. Aos 50 sou uma mulher para paladares sofisticados. Não sou mais um queijo Minas Frescal, não sou mais uma Ricota, não sou um queijo amarelo qualquer para um lanche sem compromisso. Não sou para qualquer um, nem para qualquer um dou bola, agora tenho status, sou um queijo Gorgonzola. (Maitê Proença)

Maitê Proença

No instante em que se pensa em agradar uma pessoa, o mesmo em agradar-se, o “clássico”, seja ele o que for, é a regra básica para não errar. Mas há quem prefira a ousadia, a inovação. Então, me permiti, inspirado pelas palavras da Maitê, a mostrar um pouco do gorgonzola que reside no meu eu. E assim, escrevi uma coisinha pra liberar um pouco do “mofo azul” do queijo que habita em mim. Para causar um clima com a leitura, sugiro que dê o play no vídeo abaixo, e só depois, quando a música estiver tocando, comece a ler o que eu escrevi abaixo. Permita-se entrar na brincadeira, livre-se de pré-conceitos. Vamos lá...




No princípio tudo era boca... vindo do caos originário da teogonia até chegar a fundição do eu psíquico... Uma pulsão gastronômica onde a oralidade se bifurca entre sexo e castidade.

O que comemos, então? Nada, provavelmente diria Lacan, como disse ao referir-se à anoréxica, em relação à qual acrescentou: ela embucha significante. Se a anoréxica nada come, a bulímica come tudo, todo o tempo. Uma e outra respondem, assim, a uma demanda materna. Uma não quer preencher-se, e a outra não quer esvaziar-se. O vazio e o cheio são dois fantasmas. Mas trata-se sempre do mesmo vazio, o que a mãe deixou ao esvaziar-se. (Lemoine-Luccioni, ?Las Mujeres Tienen Alma?,  Barcelona, Biblioteca de Psicoanálisis Editorial Argonauta, 1990, p. 24-25)

Cama e mesa sempre remetem uma união, onde os prazeres afloram e nos permite conhecer zonas erógenas que nos levam em instantes da gula a luxúria.
Toalha mesa vira colcha de cama... onde vibram as papilas gustativas como se estivesse num vendaval; explodem os sabores, misturam-se aromas e o êxtase aparece como uma possessão absoluta para dizer que está saciado , por enquanto.
A energia do que antes era o caos, se espalha liberando as fantasias deliciosas que estavam presas naquelas muralhas de carne e sangue – loucuras doces (umas até salgadas) flambadas com conhaque ou regadas ao vinho do Porto.
Na mesa ou na cama os ingredientes são os mesmo: carnes - gordas ou magras; especiarias indianas, africanas, asiáticas, mediterrâneas sul-americanas, exóticas, potentes, que foram escolhidas por suas histórias – ou simplesmente pela geografia da proximidade.
Na cama, como na mesa, precisamos de “temperamentos”. Mistura-se o que se quiser. E quando se quer, vê-se as retinas iluminadas de canibais lascivos que pretendem honrar a tradição de saborear a carne humana. Daí, é partir-se pra aventura de descobrir o estrangeiro que está no outro. Par tanto faz-se necessário aguçada percepção e conhecimento, sobre técnicas e preparo, sobretudo de aquecimento, todas apuradas. Exploração e devoração tornam-se cúmplices de “um comer junto”.
A regra básica neste caso diz: a refeição sempre estará esperando por você - na mesa ou na cama, e nelas a comida sempre pode ficar melhor. Podemos, sim, ser queijo gorgonzola, mas podemos nos tornar peras com gorgonzola e mel. Pra isso, basta estarmos prontos para os delírios gastronômicos. Faça sua mesa e e deixe a cama pronta - ou vice e versa. 
A minha cara de Pera com gorgonzola e mel. 
  
Pera com gorgonzola e mel

1kg de pera
500ml de água
1 colher de sopa de suco de limão
½ xícara de chá de mel
1/4 de xícara de chá de suco de laranja
½ xícara de chá de gorgonzola
1 colher de sopa de cream cheese

Preparo: lave bem as peras deixando os cabinhos, em seguida corte-as ao meio. Com auxílio de uma colher de chá retirar uma parte do miolo. Deixar a pera na água com suco de limão até finalizar a operação. Em uma vasilha colocar o mel e incorporar o suco de laranja até homogeneizar. Em uma fôrma colocar as peras com a pele para baixo e pincelar com a mistura de mel com o suco de laranja. Levar as peras ao forno pré-aquecido a 200ºC por 30 minutos. Desligar e deixar as peras murcharem no forno fechado por +/- 15 minutos. Em uma vasilha colocar o gorgonzola e o cream cheese. Misturar até homogeneizar. Retirar as peras do forno, pincelar novamente com mel e rechear com gorgonzola. Levar ao forno pré-aquecido 180ºC por mais 3 minutos. Seguir em seguida.



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